segunda-feira, 15 de julho de 2013

A inclusão digital na área rural não pode parar de avançar

A inclusão digital na área rural não pode parar de avançar. Apesar de crescer a oferta de conexões, telecentros fecham por falta de equipamentos ou de apoio na gestão. Onde as iniciativas vingaram, as tics transformam vidas e comunidades.
Aurea Lopes, Lia Ribeiro Dias e Rafael Bravo Bucco

ARede nº 85 - outubro de 2012
NAS COMUNIDADES RURAIS, tradicionalmente desprovidas de opções de cultura e de lazer, um centro público que ofereça conhecimento digital e acesso às tecnologias da informação representa muito mais do que um lugar onde se aprende a usar o computador e onde se navega na internet sem pagar. Ou onde agricultores familiares e seus filhos têm a chance de utilizar ferramentas de desenvolvimento amplamente difundidas entre as populações urbanas. Um telecentro rural – mostram as experiências bem-sucedidas – torna-se também um espaço de convivência, de onde brotam iniciativas que fortalecem a cultura local ou que geram renda para a região. É por esse valor agregado, acima de tudo, que os (poucos) projetos e programas de inclusão sociodigital no campo não podem se extinguir.
Infelizmente, porém, as iniciativas existentes passam por dificuldades estruturais e gerenciais. Os principais programas estão em “avaliação e reestruturação”, contabilizando diversas unidades desativadas. As novas ações anunciadas para o campo demoram a decolar. E o paradoxo é que a oferta de conexões rurais aumenta – timidamente nos planos de banda larga popular, mais fortemente em escala comercial. E vai crescer ainda mais a partir de 2013, quando as concessionárias de telefonia fixa – Oi, Telefônica/Vivo, CTBC e Sercomtel – começarem a cumprir as metas de atendimento obrigatório da zona rural, estabelecidas no leilão das frequências de 450 MHz (ver página 13). Então, quem pode, compra as próprias máquinas e contrata serviços de operadoras. Nenhum problema nisso, ao contrário. É um avanço. O problema é que os telecentros, que poderiam exercer papéis estruturantes – oferecendo à comunidade serviços e cursos, oficinas, projetos de produção e fomento de saberes locais – acabam esvaziados. E lutam para não fechar.
capa a hora e a vez de quem vive no campo06Uma história que ilustra esse quadro começou na garagem de uma casa do assentamento do Incra de Barra Grande, distrito de Paraty, Rio de Janeiro. Com experiência de trabalho em uma escola municipal, há 16 anos Elaine Magali Alves se mudou para o assentamento, onde planta banana e palmito. Em março de 2006, ela teve a ideia de colocar o seu PC na garagem de casa, abrir a porta e chamar a criançada da rua para explorar a máquina – não havia acesso à internet.
Nove meses depois, eram dois computadores (a mãe cedeu mais um) e 36 crianças para “aprender informática”. Em 2007, Elaine fez um curso de Linux, formou dois jovens para ajudá-la e desenvolveu uma metodologia de ensino. Aí chegou o terceiro computador, igualmente doado. E mais 16 alunos. Total: três máquinas para 52 crianças e adultos. “A essa altura, eu já tinha feito uma biblioteca, também na garagem. Enquanto uns ficavam no computador, os outros liam, brincavam, jogavam”, conta Elaine.
A iniciativa da moradora do assentamento, hoje presidente da Cooperativa de Produtores Rurais de Paraty (Pacova), foi apoiada em 2008 pelo projeto Furnas Digital. A empresa montou um telecentro na cooperativa com dez computadores com 156 kb de memória e HD de 10 MB, rodando Linux. Chegou a internet, com link Gesac de 1 Mbps. O curso de informática passou a ser regular, de março a dezembro, manhã, tarde e noite. Os adultos começaram a usar os micros para trabalhar, fazer Imposto de Renda etc.
capa a hora e a vez de quem vive no campo02As crianças vão no contraturno escolar. Não apenas porque escola local não tem laboratório de informática. Eles gostam do telecentro da Pacova porque ali há uma biblioteca da Arca das Letras (projeto do Ministério do Desenvolvimento Agrário), futebol de botão, frescobol e amarelinha feitos pelos jogadores com materiais reaproveitados, oficinas de bonecas de pano, artesanato, e outros atrativos. “Na comunidade rural, as crianças vão para a escola e depois não têm o que fazer. Aqui é um espaço de convivência, onde eles brincam, aprendem”, diz Elaine, professora que a garotada vai buscar em sua própria casa quando atrasa um pouquinho.
Cada vez mais, porém, esse telecentro rural perde força como propulsor da inclusão sociodigital. “Estou me voltando para atividades esportivas para manter os meninos aqui”, conta Elaine. O fato é que, diz ela, a “comunidade está desanimando” porque as máquinas – exatamente as mesmas, desde a inauguração – estão ultrapassadas, quebradas e não dão conta da evolução da tecnologia. Em 2011, foram 109 alunos. Em 2012, 69. A professora explica: as pessoas começam a comprar equipamentos mais potentes, mesmo que usados, e a acessar a internet pelos celulares. É mais rápido que no telecentro. E elas preferem pagar para ter acesso de qualidade. “Aqui no telecentro não dá para abrir um vídeo no YouTube... imagine fazer uma oficina de audiovisual!”, ressalta Simara de Oliveira Silvestre, monitora e primeira aluna adulta nas turmas da garagem.
capa a hora e a vez de quem vive no campo07Elaine fez uma capacitação em manutenção de computadores e conserta ela mesma, ou com ajuda dos monitores que forma, aquilo que é possível. Outros reparos são feitos gratuitamente por um simpatizante do projeto. Hoje funcionam sete das dez máquinas originais. Houve uma doação de dez máquinas pelo Serpro, mas não funcionam e Elaine não teve condições de mandar arrumar – não tem recursos nem para comprar tinta para a impressora. O custo de energia, cerca de R$ 90 mensais, é pago com a venda de doce de banana, produzido por um grupo de mulheres ligadas à cooperativa.
Esse não é um caso isolado. Só nos arredores de Barra Grande há mais dois telecentros do Furnas Digital desativados, embora tenham até antena Gesac. O programa, explica Paulo Dias, coordenador de Responsabilidade Social da empresa Furnas, está passando por uma reavaliação para redefinir estratégias. O objetivo é melhorar a sustentabilidade e fortalecer as parcerias feitas para o programa.
No início de 2012, foi iniciada uma pesquisa com 16 das 50 unidades lançadas originalmente pelo programa, em 2008. “Estão sendo averiguados os recursos e os problemas, para que façamos os ajustes necessários”, relata Dias. Ele conta que já é possível constatar, pela amostragem, que 60% dos telecentros estão com conexão Gesac funcionando. Outra conclusão importante é que há necessidade de remunerar o gestor local. “Entendemos que o monitor, o facilitador, pode ser voluntário. Mas o gestor não é para ficar meia hora, uma hora no telecentro... por isso, ele precisa ter uma remuneração. Não sabemos de que forma vamos fazer isso, mas esse é um desafio para o projeto”, admite Dias.
À espera da expansão
O mais abrangente programa de inclusão digital na área rural é o Territórios Digitais, criado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). Bem-sucedido, já implantou 135 telecentros no campo, chamados Casas Digitais. As unidades atendem a mais de cem mil pessoas, de cerca de 20 mil famílias. A expectativa de um grande salto nas ações surgiu em 2009, quando o MDA foi contemplado com mais 2.017 unidades, dentro do programa federal Telecentros.BR. No entanto, até agora essa expansão não se concretizou. De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Territorial do ministério, responsável pelo projeto, espera-se, até o final deste ano, a entrega de 681 novas Casas. Para as demais, não há previsão.
Onde o projeto está em pleno vapor, os ganhos são imensos (ver abaixo). Mas dificuldades básicas ainda não foram superadas. Em Kalunga Engenho II, em Goiás, uma comunidade quilombola batalhou para montar o telecentro e ainda luta para mantê-lo. O povoado abriga por volta de 500 pessoas – crianças, jovens, adultos e idosos descendentes de escravos. A área do quilombo ocupa 253 mil hectares nas cidades de Cavalcante, Teresina de Goiás e Monte Alegre de Goiás. Engenho II é apenas um dos agrupamentos. “São terras consideradas improdutivas, só em 25% dá para plantar. Plantamos o básico de tudo. Só não planta trigo e soja. E vendemos apenas o excedente. O dinheiro que entra na comunidade hoje é de professores, aposentados e do turismo”, conta Sirilo dos Santos Rosa, 58, líder de comunidade.
A casa de Rosa é o centro do povoado. Na frente, há um orelhão – até pouco tempo atrás, o único meio de contato rápido com o mundo exterior. Há três anos, porém, a situação começou a mudar. Um grupo de jovens kalungas inscreveu o quilombo no programa Territórios Digitais, do MDA. Para receber um kit de 11 computadores (um servidor), impressora laser, estabilizadores e conexão Gesac, a condição era a comunidade oferecer uma infraestrutura mínima: área para acomodar o telecentro e energia elétrica. O grupo acionou a Associação Comunitária Kalunga Engenho II para conseguir uma sede para a Casa Digital.
capa a hora e a vez de quem vive no campo04A opção foi aproveitar um galpão onde antes eram estocados tijolos. “A gente trocou telhado e colocou as laterais. A construção não foi demorada”, lembra Domingas Natália dos Santos Rosa, vice-presidente da Associação. Em 2011, chegaram as máquinas. Mas, apesar da reforma, o ambiente ainda estava danificado. “Para a Casa Digital funcionar demorou bastante. Pensei até que nem ia mais acontecer”, diz Domingas. Os equipamentos ficaram amontoados em um canto por quase um ano, até a prefeitura de Cavalcante ajudar a comprar telhas e fechar o buraco no teto. O técnicos do MDA voltaram ao local e, em abril deste ano, com a ajuda de Leonídio Francisco Maia, atual monitor da Casa Digital, colocaram tudo para funcionar. “Já tem seis anos que trabalho como monitor. Fiz formações, cursos básicos em Cavalcante e o curso mais avançado do projeto Formação Gesac, em Goiânia. Fiz para trabalhar no telecentro da cidade, mas vim para cá porque aqui estava parado. Senti a necessidade de voltar para ajudar. Sou da comunidade, moro e agora trabalho aqui”, conta Leonídio.
Além do acesso livre à internet, a Casa Digital oferece cursos de informática. O professor é o próprio Leonídio: “Ensino o que é um computador, as ferramentas básicas, editor de texto, planilhas, apresentações e desenhos”. O sistema operacional é o Fedora, baseado em Linux. A Casa funciona de segunda a sexta-feira, das 7h às 11h e das 13h às 17h. Leonídio tem vontade de estender o horário até mais tarde e abrir aos finais de semana. “Os mais velhos têm que trabalhar durante o dia. Seria interessante que tivesse mais um turno de funcionamento da casa digital à noite”, ressalta. Mas, sozinho, não dá. “Um bolsista me ajudaria bastante”, afirma.
Mesmo trabalhando só, ele tem conseguido dar assistência aos alunos da escola local, a EM Joselina Francisco Maia, que fazem pesquisas a pedido dos professores. É o caso de João Pedro, 17, que vai à Casa Digital quase diariamente. “Todo mundo precisa saber mexer com o computador para arrumar um serviço lá fora. Para mim é importante porque pretendo fazer um curso técnico e futuramente ir para a faculdade. Quem sabe um dia, se puder, ajudo o Leonídio”, diz o estudante.
capa a hora e a vez de quem vive no campo05Outra que aproveita a conexão é Tamara Francisco Maia, de 15 anos. “Nunca tinha mexido em computador antes da Casa Digital. Na escola, o professor passava trabalhos e a gente não tinha muito onde pesquisar. Agora, posso buscar na internet”, conta. Além dela, o irmão Isael, de 11 anos, fez o curso de introdução à informática. Assim como no assentamento de Paraty, a escola de Cavalcante não tem laboratório de informática. Por isso, a Casa Digital virou uma extensão da sala de aula. O professor João Francisco Maia, que leciona português e história, percebeu que o desempenho dos alunos melhorou com a chegada dos micros e da conexão. “Pelo menos uma vez por bimestre a gente vai até a Casa Digital, como parte da aula”, relata.
Ele só espera que não se repita na Casa Digital o mesmo que aconteceu com o computador usado na administração da escola, que quebrou e ficou sem conserto. É que, em julho, três meses após a inauguração da Casa Digital, três das dez máquinas quebraram – entre as quais, o servidor. Esperam conserto até hoje. A impressora também não pode ser usada pois o estabilizador está queimado.
No estado de São Paulo, o governo iniciou, em março, o programa Acessa Rural, vertente do Acessa SP para o campo. O povoado escolhido para receber o primeiro de uma série de onze telecentros – que estão previstos para funcionar até o final do ano – foi Prudêncio e Moraes, na cidade de General Salgado, região de Votuporanga. A localidade, onde moram 500 pessoas, não tem telefone fixo e o celular pega mal, quando pega. “Se sair de casa dá pra falar, às vezes”, diz Daniela Ribeiro, a única monitora da unidade. Como parte do programa, o povoado recebeu três torres que distribuem sinal Wi-Fi aos moradores. O link é de 2 Mbps, conexão utilizada metade para o telecentro, metade para as torres. Na comunidade, a rede sem fio fica disponível durante todo o dia, a semana inteira.
capa a hora e a vez de quem vive no campo01O Acessa de Prudêncio tem seis computadores, um servidor e impressora a laser. Funciona de segunda a sexta, das 8h às 11h e das 13h às 17h. A internet chega por rádio. A manutenção dos micros é feita por Daniela, sob orientação de profissionais da Prodesp, a companhia de processamento de dados do governo paulista. Quando é preciso trocar componentes, ela aciona o órgão, que envia uma pessoa. Hoje, todas as máquinas funcionam. O servidor queimou uma vez e, entre o pedido de conserto e o conserto, levou um mês. “Depende do número de chamados que eles têm”, explica a monitora.
Daniela, que é responsável por abrir e fechar o telecentro todos os dias, é também a professora de informática. Ensina os usuários a usar os programas, navegar na internet, fazer pesquisas, criar e-mail. Também imprime boletos de contas para quem precisa ir ao banco da cidade pagar a luz e a água. “Ainda não consigo oferecer oficinas. No momento, trabalho com a inclusão digital da terceira idade e com um ensinamento de fácil compreensão para aqueles que nunca estiveram na frente de um PC”, diz. Em média, 50 pessoas passam, por dia, pelo telecentro. Estudantes fazem pesquisas escolares. Os mais velhos fazem compras, estudam, se inscrevem em vestibulares. “Duas senhoras vêm aqui para fazer os cursos gratuitos online do portal do Acessa SP”, relata.
Ricardo Mallet, gerente do Acessa SP, informa que, por enquanto, se trata de um projeto-piloto: “Não sabemos ainda se vamos manter esse formato em todas as unidades”. Por serem comunidades pequenas e distantes da cidade, explica ele, as operadoras de telefonia não se interessam em explorá-las comercialmente. Segundo o gerente, um dos objetivos do programa é sanar essa deficiência estrutural, oferecendo, além do espaço de acesso à internet, as redes Wi-Fi abertas. “Queremos levar conectividade a quem não tem nenhuma”, destaca, acrescentando que um levantamento prévio apontou que 2/3 da população têm smartphone.
O programa funciona a partir de parcerias com as prefeituras. Os governos locais providenciam o espaço físico do telecentro e pagam o monitor. O Acessa SP fornece os equipamentos, a instalação, treinamento ao monitor e manutenção. Em Prudêncio, a Motorola construiu as torres Wi-Fi. Os links de 2 Mbps de internet em todas as comunidades serão fornecidos pela Telefônica/Vivo, como contrapartida contratual da concessão de exploração da operadora.
As demais dez unidades do Acessa Rural serão instaladas em povoados das cidades de Andradina, Matão, Flórida Paulista, Oroeste, Guaiçara, Piracicaba, Pindamonhangaba, Fernandópolis e Votuporanga. Todas fazem parte do projeto-piloto, que vai até junho de 2013 e mostrará se efetivamente há demanda por conexão pública nessas comunidades isoladas. “Depois disso é que o governo vai decidir se continua ou interrompe o programa nas zonas rurais”, avisa Mallet. O gestor, porém, está otimista: “Hoje existem mais de 1,8 mil povoados com as características necessárias para receber o programa”.


Atendimento obrigatórioA partir do final deste ano e início de 2013, as concessionárias de telefonia fixa – Oi, Telefônica/Vivo, CTBC e Sercomtel – começam a cumprir as metas de atendimento obrigatório da zona rural brasileira, com a oferta obrigatória de voz e dados para as comunidades localizadas dentro do raio de 30 quilômetros, a partir do distrito sede.
As metas de cobertura da zona rural, até então ignorada por todas as políticas públicas do setor de telecomunicações, foram estabelecidas como obrigação para as concessionárias no leilão das frequências de 450 MHz, reservadas para as comunicações rurais, e de 2,5 GHz, para a telefonia móvel de quarta geração. O leilão foi realizado em junho deste ano. Como nenhuma empresa comprou as frequências de 450 GHz, os que compraram as licenças nacionais de 2,5 GHz vão ter de construir a infraestrutura de rede para atendimento da zona rural, com tecnologia sem fio, que será utilizada pelas concessionárias para prestar o serviço.
A cobertura da zona rural será feita de forma escalonada até dezembro de 2015, quando todas as comunidades deverão estar atendidas. Até junho de 2014, 30% dos municípios devem dispor de ofertas de voz e de acesso à internet, percentual que passa para 60% até dezembro do mesmo ano e precisa atingir 100% no final do ano seguinte.
O valor máximo a ser cobrado pelo serviço foi fixado em R$ 30,6 para voz e R$ 32,59, para dados (internet), em um total de R$ 62,65 por mês para o assinante dos dois serviços, que também serão comercializados individualmente. O serviço básico de acesso à internet para a zona rural, pelo preço mensal de R$ 32,39, prevê, inicialmente, velocidades de 256 kbps para download e 128 kbps para upload, em pacotes com franquia de dados de 250 MB. Em 2017, a velocidade deve subir para 1 Mbps (256 kbps de upload) e a franquia para 500 MB.


Histórias de sucesso nos Territórios DigitaisUm estudo realizado pelo pesquisador Márcio Ferreira, da Universidade de Brasília, mostra por que é necessário e urgente investir nos programas rurais. Ele visitou quatro localidades onde o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) instalou Casas Digitais. Seu objetivo era conferir de que maneira a população absorveu a tecnologia disponível nos telecentros. “A exclusão social pode ser reduzida ou aumentada em função do nível de inclusão digital dos sujeitos. Quanto mais as pessoas souberem lidar com o computador e a internet para resolver as coisas cotidianas, melhor vai ser o nível de inclusão social”, explica.
Ferreira aponta os elementos impactados pelas tecnologias da informação e da comunicação (TICs): “Esses elementos são o desenvolvimento da cognição, que é o conhecimento de mundo, o conhecimento escolarizado; o desenvolvimento político dos sujeitos e das comunidades; o desenvolvimento econômico; e o desenvolvimento cultural. Além disso, tenho falado de dois outros termos-chave, que são o desenvolvimento da cidadania e da democracia”.
Ele cita, por exemplo, o assentamento Itamarati II, no município de Ponta Porã (MS). A Casa Digital local, relata, é um centro de formação de sujeitos políticos. Eles têm um blog que retrata o movimento social e o papel do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na comunidade. “Vemos que o uso das redes sociais contribui para o desenvolvimento da criticidade política desses sujeitos. Eles passam a ser mais atuantes e a compreender melhor os meandros políticos do país”, diz o pesquisador.
Na pesquisa, o impacto econômico também mereceu atenção. No assentamento de Santana, em Monsenhor Tabosa (CE), a comunidade criou um site para vender a produção de mel. Na Fazenda Larga (DF), os pequenos agricultores usam a internet para fazer cotação de preços do que produzem, aumentando o poder de negociação. “Eles também estão encontrando formas alternativas de melhorar a produção a partir de pesquisas, entrando em contato com a Embrapa pela internet, assistindo a vídeos sobre produção agroecologicamente correta”, ressalta Ferreira.
Mas, de acordo com o professor, nada é mais impactado que o desenvolvimento cognitivo e cultural. Em Itamarati, os responsáveis pela Casa criaram um curso de informática básica. Muitos dos que fazem o curso acabam procurando instituições de educação a distância. Pelo menos três alunos utilizam a Casa Digital para fazer um curso superior. Na comunidade de Santana, em Monsenhor Tabosa, são pelo menos 13 alunos em cursos superiores a distância. Em Sítio Soledade, que fica na cidade de Mauriti (CE), os usuários fizeram curso técnico do Etec Brasil. “Dois fizeram técnico em edificações, curso que atende às necessidades locais”, conta.

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