sábado, 20 de novembro de 2010

Com 70% de alunos negros, curso de Educação no Campo luta contra exclusão

Licenciatura na UnB Planaltina forma professores para lecionar em povoados rurais e carentes, inclusive quilombolas

João Campos - Da Secretaria de Comunicação da UnB

Em 20 de novembro de 1695, Zumbi dos Palmares morreu decapitado pelo Exército brasileiro. Mais de 300 anos depois, a data marca o Dia da Consciência Negra no Brasil. Ainda hoje, a luta para apagar as marcas de uma história de segregação racial e desigualdade social não acabou. Continua com milhares de negros espalhados pelo país que, como zumbi, lutam para transformar a realidade. Muitos deles sentados nas salas de aula da Universidade de Brasília.
No curso de Educação no Campo da Faculdade UnB Planaltina, criado em 2007, 70% dos alunos matriculados são negros. São estudantes como João Francisco Maia, 26 anos. Quilombola como Zumbi, João vive na comunidade de Engenho 2, no município de Cavalcante (GO), a 330 km de Brasília. “O passado de guerras ficou para trás. Hoje a principal ferramenta para criar uma sociedade mais justa para todos é a informação”, afirma.
O curso reúne cerca de 200 estudantes e 15 professores. O objetivo é formar e capacitar docentes para a educação em áreas rurais. “A maior parte da população que vive nessas regiões é negra e carente”, explica o professor Rafael Villas Bôas. Segundo ele, um dos objetivos das disciplinas é ajudar na organização social dessas comunidades. “Pela falta de políticas públicas após a abolição (1888), hoje as condições de vida nesses lugares são precárias”. Ser morador do campo é pré-requisito para entrar no curso, que faz parte da política de ações afirmativas da UnB.       
Para os estudantes entrevistados pela UnB Agência, a importância do Dia da Consciência Negra está na oportunidade de reflexão. Reflexão que é feita diariamente nas salas de aula de Planaltina e transformada em ações fora dali. “Nosso objetivo é transpor esses conhecimentos em benefícios para comunidade”, conta a professora Rosineide Magalhães. A maior parte dos quatro anos do curso ocorre com os alunos trabalhando nas regiões de onde vieram, com a supervisão dos docentes. “É um sistema de alternância”, explica. Ora os professores vão até os alunos, ora os estudantes vêm à UnB.
APOSTA NO CAMPO Como boa parte dos colegas, a missão de João Maia é transformar os conhecimentos adquiridos na UnB em ações concretas nas comunidades. Segundo ele, o principal problema dos quilombolas da região de Cavalcante (GO) é a falta de informação e de políticas públicas que permitam uma vida digna no campo. “Sem apoio e educação, muitas famílias buscam a cidade para arranjar meios de sobreviver”, diz. “E isso tem uma conseqüência grave: a negação da identidade e da própria cor”.
A jovem Aneli Soares da Silva, 23, também sonha em melhorar a vida da comunidade de Ribeirão dos Bois, no município de Teresina de Goiás (GO), onde nasceu e cresceu. Sonho que pouco a pouco vira realidade. “Até pouco tempo não havia espaço para o diálogo”, observa a estudante do segundo semestre de Educação no Campo. Apesar do pouco tempo de curso, ela já divide os conhecimentos com os vizinhos por meio de oficinas voltadas, principalmente, às crianças carentes.
AVANÇOS – Os "novos zumbis" reconhecem avanços nas políticas públicas para as populações do campo, como o curso da UnB. Mas têm consciência de que a caminhada é longa. “Restringir o acesso à educação é a principal ferramenta para manter um povo submisso”, afirma Henrique Manico. Aos 42 anos, o angolano que está no Brasil há 20 anos é um dos poucos professores do pequeno município de São Domingos (GO). Ele viu no curso oferecido pela UnB a oportunidade de se fortalecer para essa luta. “Enquanto predominar a idéia de que quanto mais branco, melhor, as diferenças só vão aumentar em um país rico pela sua diversidade”, diz Aneli.

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